A participação feminina na compra da casa própria, sozinhas ou compondo a renda do casal, cresceu nos últimos anos e se tornou fundamental

RIO — Tradicionalmente, as mulheres sempre tiveram o maior poder de decisão na compra de um imóvel. Independentemente de quem pagasse — geralmente o homem, até então —, elas que costumavam bater o martelo, mesmo na decisão conjunta. De cinco anos para cá, porém, essa realidade mudou. Agora, a participação delas no mercado imobiliário como pagadoras também tem se tornado fundamental.

Uma pesquisa da Inteligência de Mercado da incorporada RJZ Cyrela revela que, atualmente, 63% dos compradores de imóveis no Rio são mulheres. Outros dados do recorte sobre o perfil de comprador — aqui, incluindo os homens — mostram que 56% são casados, 19% estão em um relacionamento estável, 18% são solteiros e 6% noivos. Em relação ao nível de instrução, 73% têm ensino superior, 16% têm pós-graduação e 11%, o ensino médio completo. Já quanto à idade, a maioria está entre 35 e 44 anos.

Um outro levantamento, desta vez realizado pela Associação Brasileira de Administradoras de Consórcios de (Abac,) também mostra crescimento da participação delas: em maio, 35% das vendas de consórcios de imóveis no país foram feitas para mulheres. E, ainda de acordo com esta pesquisa, na comparação com os cinco primeiros meses de 2018, houve um crescimento de 14% de mulheres ativas com o consórcio.

Juntos e shallow now

Apesar dos números, ainda é difícil mensurar com precisão a quantidade de mulheres que compram seus imóveis sozinhas ou o quanto elas participam na composição de renda. Contudo, a percepção de incorporadoras, imobiliárias e de quem está na linha de frente do mercado é de que, além da aquisição individual, cada vez mais o financiamento do imóvel pelo casal só é possível com participação da renda delas.

— A participação feminina na economia brasileira é muito grande hoje, seja qual for seu estado civil. Elas passaram a ser grandes consumidoras de vários mercados, e um deles é o imobiliário. Há um expressivo número de mulheres comprando imóveis sozinhas — afirma Luiz França, presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc).

— E quando se fala em composição de renda, dada a posição que elas vêm tomando na economia brasileira, o público feminino é uma parte importante da compra — acrescenta.

O gerente comercial da Avanço Realizações, Tiago Sampaio, concorda com França sobre haver mais mulheres comprando imóveis sozinhas, mas ressalta que a maioria ainda das compras é feita por casais.

— O curioso neste último caso é que, hoje, a maioria das aprovações do financiamento depende da composição. O homem não compra mais sozinho. Geralmente é meio a meio.

Para o diretor-geral da Construtora Riviera, Ari Ferraz, a independência delas mexeu com o mercado.

— É uma situação que não se via no passado — diz ele.

Uma outra peculiaridade na compra de imóves é que, historicamente, homens davam atenção a questões práticas como valores, segurança e acessibilidade e as mulheres, a detalhes, conforto e estética. Hoje, isso está bem diferente. A maior preocupação delas passou a ser em relação ao comprometimento do financiamento.

— Outra diferença é que, na compra sozinha, ela é mais objetiva no que deseja. Quando é um casal, a pressão de negociação é maior. Geralmente, as mulheres são mais práticas nesse sentido — explica Sampaio.

Veja:

Documentação

É importante pesquisar a idoneidade da construtora, verificar a aprovação dos projetos na prefeitura e se o registro da incorporação está no cartório competente. Entre os documentos que podem ser conferidos estão a certidão negativa de débitos do imóvel pronto e, se for lançamento, a matrícula do RGI no cartório da região. Outro documento é o Habite-se, conferido na prefeitura. Sem ele, não é permitido morar nem alugar.

Prestações

Se for financiamento, o comprador precisa estar atento às taxas relativas a este tipo de transação, como vistoria do imóvel, seguro, emissão de contrato e as próprias prestações. As instituições bancárias geralmente fazem a simulação de todo o empréstimo. O ideal é pedir este cálculo para saber o que se vai pagar antes e depois da entrega das chaves. Em geral, os primeiros anos são mais baratos. Uma orientação é que a prestação mensal (considerando todos os custos) não deve ultrapassar 30% da renda.

Outros custos

Além do valor da entrada e da parcela, o cliente precisa dispor de uma verba para o pagamento da documentação, como ITBI, escritura, certidões, ônus reais e registro da escritura. Esses documentos custam, em média, 5% a mais no valor final do apartamento. Exemplo: em um apartamento de R$ 400 mil, estas despesas custariam cerca de R$ 20 mil. Atenção aos imóveis que têm as taxas anuais de foro e laudêmio (paga pela transferência da propriedade e pode variar entre 2% e 6%).

Documentos do comprador

No caso do imóvel na planta, são solicitados documentos como identidade e CPF, certidão de estado civil e comprovante de residência atualizado. Para renda, os últimos três contracheques, declaração do Imposto de Renda e extratos dos últimos meses, entre outros. Para usar o FGTS, pede-se cópia da carteira de trabalho, extrato do FGTS com saldo atualizado e, se já foi proprietário de imóvel, apresentar Ônus Reais (RGI) atualizado. O comprador deve estar atento para não esquecer de declarar o imóvel no próximo Imposto de Renda.

Financiamento

Quem planeja comprar a casa própria busca os menores juros de financiamento e faz as contas para tentar adequar a prestração ao orçamento mensal. As instituições financeiras cobram dois custos fixos: uma taxa de R$ 25 por mês para administrar o financiamento e uma cobrança única para avaliar o imóvel, que em geral é de R$ 3.100, independentemente do preço da moradia. Os bancos acrescentam à parcela mensal seguros que cobrem morte e invalidez ou danos ao imóvel. Estes variam de acordo com o valor do bem, a idade do financiador e a seguradora e podem representar um grande aumento no montante a pagar todo mês.

Vistoria

O processo de vistoria, quando o cliente valida se está recebendo o que comprou, é diferente para apartamentos comprados na planta ou prontos. Para os prontos, é marcada a vistoria técnica, quando o cliente faz os apontamentos necessários e é marcada uma vistoria de entrega. As chaves do apartamento são entregues e a vistoria é feita após o cliente quitar a unidade. Para os vendidos na planta, é agendada uma vistoria no ato da entrega das chaves do empreendimento, após a quitação.

Foi o que aconteceu com Suliane Conceição da Silva, que comprou um imóvel em Duque de Caxias, no empreendimento Central Park Riviera. Mesmo morando com o “namorido” há 10 anos, elas quis comprar sozinha, por segurança.

Por décadas, a mulher foi meramente a dona “de” casa. Agora, cresce o número de donas “da” casa Foto: Pixabay

— A gente nunca sabe o dia de amanhã. Então, eu queria algo que fosse só meu. Usei o FGTS para dar a entrada e fiz um financiamento com parcelas que se encaixam no meu salário — diz a jovem de 29 anos.

França, da Abrainc, destaca que o mercado mudou de uma forma geral, não apenas pelo poder de compra feminino, que cresceu. Segundo ele, há um tendência de imóveis cada vez mais compactos e bem localizados, com ampla oferta de serviços.

Quando o amor acaba, vale o que está escrito

Já diz o ditado que o “seguro morreu de velho”. Na hora do amor e de assinar contratos, tudo são flores. Mas, quando a magia vai embora e começam as brigas, a partilha de um imóvel pode ser bem complicada.

Em tese, para os casados pode ser mais simples, devido ao regime de bens previamente acordado no contrato de casamento. Em outros tipos de relacionamento, é mais aconselhável que o contrato esteja no nome de ambos — assim como um acordo para dividir custos.

— O ideal é que o imóvel seja comprado em nome dos dois, mas se não for assim vai valer a regra do regime de bens. E se o casal não escolher nenhum, prevalece o regime de bens oficial do país, que é o regime de comunhão parcial — explica o advogado David Nigri.

Se o casal ainda estiver pagando o financiamento, a recomendação é ir ao cartório e fazer uma escritura, que deve ser averbada no registro civil para constar na certidão de casamento e no registro de imóveis de forma que faça parte da documentação de financiamento.

O advogado Arnon Velmovistky acredita que não existe um regime de bens ideal e que a divisão vai depender da realidade do casal. Ele sugere que, se houver um grande desequilíbrio financeiro entre os cônjuges, ambos optem pelo regime da separação total de bens, que exige a elaboração de pacto nupcial.

— Na hipótese de comunhão parcial de bens, a aquisição em nome de qualquer dos cônjuges contempla o outro com 50% do imóvel — adverte Arnon.

Segundo ele, dois motivos muito comuns em brigas de casais por imóveis são quanto à permanência no imóvel por um dos cônjuges e quando ao casamento se aplica o regime de comunhão parcial de bens, mas na escritura não consta que o valor foi pago com recursos particulares de um deles, em cujo patrimônio particular deve permanecer. Outro cuidado, diz, é verificar se o imóvel alienado pertence somente a um dos cônjuges.

— Se o produto da venda for utilizado para a aquisição de outro imóvel, deverá constar na escritura uma cláusula que especifique essa situação jurídica, e o outro deverá assinar a escritura, concordando que o bem pertence somente a um dos cônjuges.

Fonte: O Globo